sexta-feira, 7 de março de 2014

Por que desejamos ser superiores?

Até quando viveremos em ritmo de maratona?
Será que devemos mesmo correr o tempo todo
 para mostrar que somos melhores que os outros?
A humildade sempre foi uma das virtudes que mais admirei em alguém. Adorava constatar quando alguém fazia algo que poderia ser considerado bom, caridoso e útil e, mesmo assim, não ficava contando vantagem, não se considerava especial e não se exibia para ninguém. O mérito da conquista e da ação pareciam ainda mais enaltecidos. De tanto admirar a humildade, comecei a acreditar que também era humilde ou, ao menos, podia ser. É como se a humildade pertencesse aos nobres de espírito. Mal sabia que, na verdade, estava cada vez mais preso a uma outra grade da alma, quase sem perceber: o desejo de ser superior aos outros. Mais do que isso, o desejo de mostrar aos outros de alguma forma como eu era superior.

Hoje em dia é comum constatar o mesmo desejo de ser superior em grande parte das pessoas. Daí me pergunto, não será isso algo natural? Mas arrisco dizer que não. Percebo que nossa atual sociedade de consumo vivencia uma feroz e silenciosa competição entre seres humanos. Essa competição é estimulada pelo próprio sistema, que cria a ilusão de que podemos nos diferenciar de outras pessoas ao consumir determinados produtos e serviços. Assim, somos condicionados a acreditar que seremos uma pessoa acima da média, única e especial se vestirmos determinadas roupas, comermos determinados alimentos, termos determinadas características físicas, frequentarmos determinados lugares, adquirirmos determinados produtos, viajarmos para determinados lugares, andarmos com determinadas pessoas, entre muitos outros. O sentido de toda a vida se resume a essa corrida para ser o melhor de todos, em todos os aspectos. 

Em algum momento que não me recordo, escolhi alguns aspectos em que poderiam fazer de mim alguém superior aos outros, acreditando nessa ideia até hoje. Quesitos como viagens, cursos, estudos, vida profissional, quantidade e qualidade de amigos, agenda social lotada e tantos outros ainda são utilizados por mim como conquistas pelas quais posso me gabar. Sem perceber, acabo deixando muito claro para as pessoas que gostaria de ser admirado por tudo isto, quem sabe até mesmo invejado. Carrego o sentimento de vitória em relação a determinadas conquistas, mas, afinal, com quem estava lutando para ser vencedor de algo? Será que era só comigo mesmo ou era também com todos aqueles que possivelmente desejariam estar no meu lugar? Por fim, a mais intrigante de todas as questões: por que eu deveria gastar a energia de uma vida inteira baseado unicamente em sustentar triunfos de ostentação? 

A superioridade não para por aí. Conviver com ela nos impede de provocar mudanças em nossas vidas. Ter que começar do zero nos torna meros aprendizes, e não é o que desejamos. Tentar ser superior o tempo todo implica em dar uma resposta falsa, mas jamais admitir que não se sabe fazer ou responder algo. A superioridade nos afasta das pessoas, cria atritos, machuca. Com ela, queremos sempre ter razão, e cada conversa parece uma batalha para mostrar que somos os melhores. O tempo todo deixamos transparecer nosso desejo de sermos vistos como alguém foda. Nos revoltamos com quem quer chegar lá também, e enxergamos no outro a mesma falta de humildade que é nossa própria característica. 

Será que é possível estar livre do desejo de ser superior? Acredito que ao estarmos livres do sentimento de superioridade, reconhecemos nossa pequeneza e ignorância perante a vida. Nos colocamos em nosso lugar, sabendo que temos tantos defeitos como qualidades, e que não há ninguém abaixo ou acima de nós. Também aprendemos que não haverá nada que nos torne pessoas melhores do que os outros. Aprendemos que não temos o direito de dar lições de moral em ninguém nem o dever de ensinar as pessoas, ainda que a força, a descobrirem o sentido da vida. Descobrimos que ao seguir nosso próprio coração, daremos a nós mesmos e ao mundo pequenas e únicas colaborações que tornarão a vida melhor. Nem por isso precisaremos ter mérito ou reconhecimento, estaremos contentes com a paz que se instalará em nosso coração. 

Constatamos também que não é necessário correr, tampouco competir. Para isso, basta notar em como a vida se torna leve e simples quando tiramos a responsabilidade dos nossos ombros de sermos os melhores o tempo todo. Automaticamente, nos damos o direito de ousar mais, errar mais, arriscar-se mais, passar mais vezes por bobo ou ridículo, fazer coisas consideradas anormais. E saberemos que, mesmo fazendo tudo isso, não seremos inferiores nem superiores a ninguém, embora tenhamos uma grande alegria internamente. 

Assim como outras prisões, também não é muito fácil lidar com o desejo de ser superior. Quando menos espero, estou lá querendo convencer os outros de como sou bom. Faz parte de mim, é difícil de combater, mas acredito que naturalmente as coisas vão se adaptando aqui dentro. Ao menos já tenho em mente que não sou nada além de um mero ser humano, mesmo que tenha que travar uma luta com meu próprio ego o tempo todo. 

Além disso, me deparo a todo momento com pessoas que também tentam demonstrar superioridade. Uma das formas por meio da qual tenho tentado lidar com a situação é buscando compreender, ouvir, entender e ceder. Ceder, nesse caso, não significa abrir mão das próprias ideias, mas sim abrir mão de tentar convencer os outros sobre nossas escolhas. 

Penso em alguns momentos que nosso desejo de ser superior é responsável por alguns consideráveis avanços e determinadas conquistas. Mas qual será o sentido dessas conquistas? Será que elas realmente nos fizeram bem? Ou apenas nos trouxeram um vazio, deslocando nossa atenção para outros fatores de nossa vida nos quais ainda não somos superiores? 

Pode ser que o desejo de ser superior seja mesmo algo natural. Pode ser que não. Pode ser também que o simples fato de ter um blog como este e desejar ter leitores assíduos seja o meu ego tentando mostrar superioridade em algo, como um talento que julgo ter para a escrita. Pode ser que seja saudável, pode ser que não. Mas creio que esta é uma das grandes prisões que temos em nossa vida. Ou, ao menos, uma das prisões que eu tenho, da qual um dia quero estar livre. Pode ser que a luta para se livrar desta prisão dure a vida toda e ainda não termine, mas acredito que terei dado alguns passos na minha própria evolução quando conseguir ser verdadeiramente humilde, ou seja, sendo realmente bondoso, sem exigir nenhum mérito, reconhecimento ou admiração em troca. 

Por fim, devemos deixar de acreditar que uma vitória só existe se houver uma competição na qual outras pessoas tenham sido derrotadas. Seria interessante viver sem competir o tempo todo. Com a inexistência de uma competição, todos são vencedores sempre!

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